O Parlamento de Portugal voltou, nesta sexta-feira (12(, a aprovar a eutanásia – morte assistida por um profissional de saúde, com votos a favor do PS, BE, IL, PAN e Livre, assim como de sete deputados do PSD. A decisão obriga a promulgação da lei pelo presidente da República em um prazo de oito dias.
Foram 129 votos a favor, 81 contra (das bancadas do Chega, PCP e maioria dos deputados do PSD) e uma abstenção (do PSD). O total ultrapassou os 116 votos necessários para a confirmação.
O decreto aprovado pelo Parlamento tinha sido vetado pelo presidente Marcelo Rebelo de Sousa. De acordo com a Constituição, perante um veto, o Parlamento pode confirmar o texto por maioria absoluta dos deputados e, nesse caso, o presidente tem de promulgar o projeto.
Este é o quarto projeto do Parlamento português para a despenalização da eutanásia, alterando o Código Penal. O tema já foi alvo de dois vetos políticos do presidente e de mais dois vetos na sequência de inconstitucionalidades decretadas pelo Tribunal Constitucional.
No último veto, em abril, Marcelo Rebelo de Sousa pediu aos deputados que deixassem claro “quem define a incapacidade física do doente para autoadministrar os fármacos letais, bem como quem deve assegurar a supervisão médica durante o ato de morte assistida”.
Desta vez, ao contrário de ocasiões anteriores, os partidos que apresentaram o projeto (PS, IL, BE e PAN) decidiram não alterar o texto aprovado no dia 31 de março passado, que nessa versão estabelece que a morte assistida por um profissional de saúde só poderá ocorrer por meio de eutanásia se o suicídio assistido for impossível por incapacidade física do doente.
Argumentos dos partidos
Durante o debate de hoje na Assembleia da República, João Cotrim Figueiredo, da Iniciativa Liberal, defendeu que os deputados têm “toda a legitimidade para deliberar sobre a morte assistida”.
“Aos que dirão que apresentar o projeto sem alterar o seu texto é uma afronta ao presidente da República, dizemos ‘não’”, já que as mensagens de Marcelo Rebelo de Sousa e os acórdãos do Tribunal Constitucional foram sempre considerados ao longo do processo legislativo, num sinal de respeito e abertura. “O mesmo respeito é agora devido à própria Assembleia da República”, afirmou.
André Ventura, líder do Chega, considerou a legislação um disparate. “Dizer às pessoas que podem recorrer à eutanásia se não conseguirem se suicidar é um disparate legislativo, uma imoralidade e uma absoluta aberração política”.
“Esta lei nunca vai entrar em vigor”, diz o parlamentar. “Porque se algum dia a regulamentação estiver concluída e o presidente tiver permitido, o tempo estará tão curto que, tenho a certeza, haverá maioria neste Parlamento que revogará a lei”.
Catarina Martins afirma que não há não “nenhuma razão para alterar a redação da lei”, já que as dúvidas presidenciais são matérias de regulamentação e não da lei propriamente dita.
“A lei deve ser promulgada como está”, acrescentou a deputada. “Hoje, com a tranquilidade de quem é coerente e amigo dos direitos, ajudamos a dar um passo decisivo e, com ele, seremos uma sociedade mais respeitadora de quem não quer ser duplamente violentado quando o fim se aproxima, violentado pelo sofrimento e pelo desrespeito de sua vontade”.
Rui Tavares, do Livre, acredita que os deputados que pretenderem levar a lei ao Tribunal Constitucional estarão dando razão a quem diz que não era num referendo que a situação deveria ser resolvida.
“Não é em referendo o lugar em que as maiorias podem decidir sobre direitos individuais das potenciais minorias. E quem tem um sofrimento que o leva a poder decidir pela sua morte será sempre – assim o esperamos – uma minoria”, frisou.
Não podemos continuar com essas pessoas, essas vidas, em suspense”, disse Inês Sousa Real, do PAN. “Estamos confiantes de que o texto reúne todas as condições constitucionais para que venha a ser promulgado e para que seja devidamente aplicado”, declarou.
O PCP, por sua vez, decidiu votar contra o projeto por considerar que a autonomia individual dever ser respeitada, mas que “uma sociedade organizada não é mera soma de autonomias individuais”.
“Insistimos que o Estado português não pode continuar a negar à maioria dos seus cidadãos os cuidados de saúde que necessitam, particularmente nos momentos de maior sofrimento”, acrescentou.
O PSD insistiu que “os portugueses deveriam ter sido chamados a se pronunciar sobre o tema, com a realização de um referendo nacional.
“Quem ficou prejudicado foi o povo português, impedido de se pronunciar sobre uma matéria de enorme sensibilidade, que não pode ser vista como mera questão médica, esquecendo as questões morais e de consciência”, afirmou a deputada social-democrata Paula Cardoso.
A deputada Isabel Moreira, do PS, disse que o Parlamento faz hoje algo que é normal em democracia: confirmar um projeto que foi votado por maioria expressiva mais uma vez e exercer competência da Assembleia, que é normal e que faz um equilíbrio entre a legitimidade da instituição e a legitimidade do presidente da República”.
A constitucionalista defendeu que “chegou o momento de a Assembleia se respeitar” e respeitar “aqueles que anseiam tanto por esse dia”.
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