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Após meia centena de demissões, Boris Johnson aceita sair de cena

Após pedidos de demissão de ministros e assessores do governo, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, aceitou nesta quinta-feira (7) deixar o cargo. Ele pretende, no entanto, manter-se em funções até que o Partido Conservador escolha novo líder.

De acordo com Chris Mason, editor de política da BBC, Boris Johnson deve pedir demissão hoje, mas continuar nas funções de primeiro-ministro até o outono. Nos próximos meses, haverá eleição interna no Partido Conservador, e o novo primeiro-ministro estará em Downing Street para a conferência anual dos conservadores, em outubro.

Nos últimos três dias, mais de meia centena de governantes britânicos apresentaram a demissão, após novo escândalo que envolveu Johnson. A debandada de ministros, secretários e assessores intensificou-se, com mais saídas de peso às primeiras horas da manhã.

Para o Partido Trabalhista, principal força da oposição, a saída de Boris Johnson é “uma boa notícia”. No entanto, a decisão “já devia ter acontecido há muito tempo”.

“Ele sempre esteve inapto para o cargo. Foi responsável por mentiras, escândalos e fraudes a uma escala industrial. E todos que foram cúmplices devem estar completamente envergonhados”, afirmou o líder trabalhista Keir Starmer.

Os trabalhistas dizem ainda que, ao fim de “12 anos de estagnação económica, serviços públicos em declínio e promessas vazias” de liderança conservadora, o Reino Unido precisa de “novo começo”.

“Não precisamos de uma mudança no topo do Partido Conservador – precisamos de mudança adequada de governo”, acrescentam.

Governo esvaziado

Só nesta quinta-feira renunciaram o secretário para a Irlanda do Norte, Brandon Lewis, a ministra do Tesouro, Helen Whately, além dos ministro da Segurança, Damian Hinds, da Ciência, o ministro júnior da Cultura, o das Pensões, Guy Opperman, dos Tribunais, James Cartlidge, e da Tecnologia, Chris Philip.

Até o novo ministro das Finanças, Nadhim Zahawi, nomeado menos de 48 horas após uma das primeiras renúncias no governo, apelou hoje à demissão de Johnson. “Isso não é sustentável e só vai piorar, para si, para o Partido Conservador e, mais importante ainda, para o país. Deve fazer o certo e demitir-se”, escreveu no Twitter.

Zahawi não esclareceu se apresentou a demissão, mas indicou que já falou com Boris Johnson ontem em Downing Street, pedindo-lhe que abandonasse o cargo “com dignidade”.

No mesmo sentido, a nova secretária para a Educação, Michelle Donelan, apresentou a demissão após menos de dois dias no cargo. “Não vejo como pode continuar”, diz Michelle, acrescentando que “implorou” a Johnson para que se demitisse.

“Deixou-nos numa situação impossível. Como alguém que valoriza a integridade acima de tudo, não tenho outra escolha”, afirmou. Para ela, só a saída massiva de governantes poderá resultar na queda de Boris Johnson, “na ausência de um mecanismo formal” para retirá-lo do poder.

Boris Johnson tinha sobrevivido a uma moção de censura dentro do partido há apenas um mês e, segundo as atuais regras dos conservadores, não era possível apresentar nova moção de censura até junho do próximo ano, no âmbito das regras da “Comissão de 1922”.

Em declarações à BBC nesta quinta-feira, a deputada conservadora Julian Smith, ex-secretária para a Irlanda do Norte – demitida por Johnson em fevereiro de 2020 – acusava o premiê de estar agarrado ao poder “ao estilo de Trump”, numa referência ao ex-presidente norte-americano que lançou suspeitas infundadas sobre fraude eleitoral nas eleições de 2020, em que perdeu para Joe Biden.

Perante o êxodo em massa, Johnson insistia nessa quarta-feira em permanecer no cargo, rejeitando o apelo dos antigos colaboradores. “Não vou renunciar, a última coisa que esse país precisa, francamente, é de uma eleição”, dizia o chefe de governo durante a tarde, lembrando as várias crises e problemas que o país enfrenta.

Com longa lista de demissões no governo, que cresce a cada hora, foram mais de 50 os governantes que bateram com a porta. Agora como primeiro-ministro demissionário, Boris Johnson terá de preencher provisoriamente todos os cargos que ficaram vagos até a tomada de posse de um novo chefe de governo.

A primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, considerou que a manutenção do atual governo, ainda que por apenas alguns meses, é “insustentável”. 

Escândalos

No poder desde 2019, ano em que substituiu Theresa May em Downing Street, o primeiro-ministro britânico sobreviveu a várias polêmicas e escândalos que se intensificaram ao longo dos últimos meses. A última dessas crises teve origem na ligação de Boris Johnson ao deputado conservador Chris Pincher, ex-responsável pela disciplina parlamentar da bancada conservadora, que se demitiu do cargo após acusações recentes de assédio sexual.

No entanto, outras denúncias de assédio de vários anos implicavam o deputado conservador, casos que Boris Johnson teria desvalorizado. Na terça-feira, o premiê pediu desculpa por ter mantido a confiança em Chris Pincher, apesar dos casos de assédio.

Muitos outros escândalos sexuais têm abalado o Executivo britânico nos últimos meses: o deputado conservador Imran Ahmad Khan foi acusado de abusar sexualmente de um rapaz de 15 anos; em abril, um deputado do mesmo partido, Neil Parish, foi suspenso do cargo após ter visto pornografia no celular enquanto estava no Parlamento;há ainda o caso de um integrante do Partido Conservador, detido em maio por suspeita de violação e assédio sexual. No último caso, a identidade do agressor não foi revelada para proteger a identidade da vítima.

Há ainda a célebre polémica das festas em Downing Street durante a pandemia, o “Partygate”: num momento de fortes restrições por causa da covid-19, o governo de Johnson e o próprio primeiro-ministro participaram em várias festas que violavam as regras em vigor.

Na sequência desse escândalo, Boris Johnson chegou a ser multado pela polícia por participar de um dos eventos e teve de pedir desculpa à rainha Isabel II, uma vez que o seu gabinete esteve diretamente envolvido numa festa que ocorreu na véspera do funeral do príncipe consorte, Filipe de Edimburgo, em abril de 2021. As festas contrastaram com a imagem da rainha sozinha no funeral do marido, em momento de fortes restrições devido à pandemia.

O Parlamento britânico continua a investigar se Boris Johnson mentiu aos deputados quando insistiu que não sabia das festas ilegais. Em maio, foi divulgado relatório detalhado sobre o ambiente das festas em Downing Street, elaborado pela funcionária Sue Gray, onde surgem repetidas descrições de consumo excessivo de álcool.

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